Vida Plena
Se quiseres emagrecer, não faças disso um propósito. Se quiseres um emprego melhor, não faças disso um propósito. Não são os resultados que queremos que geram propósitos, mas aquilo que nos identifica. E parece-me existir um propósito identitário que englobal qualquer particularidade: ter uma Vida Plena.
Atarefados como estamos com aquilo que temos para fazer, tornou-se raro pensar no tipo de vida que gostaríamos de ter. É fácil pensar em ter mais dinheiro, um carro melhor, saúde, amigos, mas tudo isso será uma consequência daquilo que torna a nossa vida plena.
Em cada dia, na cabeça ou num papel, colocamos as tarefas que temos para fazer. Existe alguma dessas tarefas dedicada a pensar no caminho que estás a trilhar com o que fazes? O que fazes faz-te ser mais e melhor? Coloco-me muitas vezes estas questões. E no cenário actual, quando a inteligência artificial fizer algo melhor do nós, deixamos de ter coisas para fazer e, consequentemente, perdemos o sentido do nosso ser? A razão de dedicarmos mais da nossa experiência de tempo a pensar naquilo que torna a nossa vida plena é o desejo de assegurar que essa vida não dependa de qualquer resultado, mas gere resultados.
A vida possui ritmos, avanços, recuos, mas é uma só. Irrepetível. Tudo se transforma a todo o momento. Por isso, ao focarmos apenas o olhar da consciência sobre as inúmeras transformações que ocorrem a cada momento, arriscamo-nos a pensar menos no arco narrativo maior, o todo feito dos múltiplos episódios quotidianos, onde reencontramos sempre o sentido e significado de cada coisa que dá corpo à nossa vida plena.
É nesse arco narrativo maior que se visiona a vida plena que todos somos chamados a ter. Imagina que faz parte da tua vida plena compreender melhor os outros, o que eles pensam e dizem, assim como o que não dizem, mas pensam. A capacidade de escutar é fundamental, mas poderás pensar ser necessário ter uma grande bagagem cultural e por isso procuras ler mais livros e memorizar o mais possível aquilo que lês. A realidade é que são poucos e raros os que conseguem esse grau de memorização e começas a sentir alguma frustração. Porém, o propósito de ler não é memorizar o que se lê. Assim, por que razão o acto de ler nos ajudaria a compreender melhor os outros, o que dizem e o que pensam?
Ler aguça a mente, abrindo-a e despertando a curiosidade. Aquele que dedica mais tempo à leitura não deve esperar memorizar tudo o que lê. O que acontece é bem maior do que isso. A leitura transforma-nos ao abrir a nossa mente à diversidade de modos de pensar. Ler para ter razão e autoridade naquilo que se diz é uma visão curta e pobre. Ler ajuda-nos a calar o interior para escutar o que nos chega a partir dos outros que estão no exterior. Não lês em silêncio? Não é de admirar que cultives com isso a capacidade de estar em silêncio. Algo fundamental para escutar os outros e acolher bem as ideias que nos partilham, dando com essas um pouco de si mesmos.
Existem muitas metodologias para definir propósitos que poderíamos utilizar para alimentar uma vida plena. Conheço a SMART, a SMARTER, o PERMA, entre outras, mas o que me parece mais difícil será enquadrar os propósitos numa experiência mais completa de tempo que não seja apenas sequencial, ou atenta à oportunidade, mas também epocal como exploro no livro "Tempo 3.0" onde afirmo que — «Na metamorfose da vida, a sensibilidade às circunstâncias requer uma síntese entre a contingência e uma experiência adaptativa do tempo.»
Pensa primeiro naquilo que torna a tua vida plena de sentido e significado, ainda que leve algum tempo. Só depois estabelece os propósitos que orientam o que fazes para chegar ao que te identifica. Acredito que assim, geraremos "tempo".
Para acompanhar o que escrevo pode subscrever a Newsletter Escritos em https://bit.ly/NewsletterEscritos_MiguelPanao - "Tempo 3.0 - Uma visão revolucionária da experiência mais transformativa do mundo" (Bertrand, Wook)