Uma ferida que volta a abrir-se…

Crónicas 27 março 2024  •  Tempo de Leitura: 2

Vivemos, agora, e mais uma vez, o caminho da Semana Maior. Enquanto nos preparamos para contemplar as feridas dAquele que veio para nos salvar, é fácil perdermos tempo e ficarmos imersos nos pedidos quotidianos que surgem a todo o momento.

Este tempo de maior interioridade e, igualmente, de maior escuridão vem-nos relembrar a importância de olharmos para as nossas próprias feridas. Este é o momento para perscrutar os silêncios que nos deixámos enraizar por tudo o que preferimos calar, esconder e não mostrar.

Mas este Jesus vem dizer-nos que nos vê. Que somos vistos como somos. Que somos amados como somos e que não precisamos de ser de outra maneira. Enquanto nos sentamos à sombra das nossas dificuldades sabemos que não estamos sozinhos porque este caminho foi também o Seu. Também experimentou a solidão ensurdecedora, também sentiu o coração a rasgar-se, também sentiu o abandono do próprio Pai, também se deixou vencer e acabrunhar pela dor e pela sombra.

No entanto, o sentido que este Deus filho veio dar à Sua Cruz dá-nos esperança para a nossa. Sabemos que haverá sempre um propósito para sofrer o que se sofre. No caso de Jesus o propósito estendeu-se até à Luz dos nossos dias. Mas e no caso da nossa própria Cruz? Que nos faz cair, vacilar, desacreditar?

Julgo que o nosso sofrimento existe também pela falta de propósito ou de objetivo que lhe atribuímos. Mas talvez, e à falta de uma melhor justificação, o sofrimento pode sempre servir para nos aproximarmos da dor do outro, dos sentimentos do outro, das emoções do outro. Para termos consciência de que o sofrimento não (me) é exclusivo. E a verdade é que esse processo de dor é um dos que mais nos pode unir como seres humanos.

Enquanto vamos caminhando até à Sexta-feira da Morte e Paixão de Jesus, saibamos também acolher no coração todas as mortes e todas as paixões que têm palmilhado os nossos dias e os daqueles que se cruzam connosco neste plano terreno.

Sabemos (e consola-nos essa certeza) que nada do que vemos hoje será para sempre. Tudo é temporário. E este tudo, tantas vezes tão difícil, é que nos prepara para a Verdade que acreditamos estar reservada para nós num plano muito mais divino e luminoso.

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Marta Arrais

Cronista

Nasceu em 1986. Possui mestrado em ensino de Inglês e Espanhol (FCSH-UNL). É professora. Faz diversas atividades de cariz voluntário com as Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus e com os Irmãos de S. João de Deus (em Portugal, Espanha e, mais recentemente, em Moçambique)

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