Servir Vital
A oração vital é a que nos ajuda a rezar sem cessar. Quando procuramos fazer bem cada coisa e por amor, o nosso rezar é vital. Porém, quando recordamos o momento na vida de Jesus em que Ele se faz serviço, fiquei a pensar o que poderia tornar o nosso servir vital.
O que é vital, vivifica. Isto é, confere à vida uma dinâmica evolutiva no tempo e no espaço. O servir vital seria o serviço que transforma o nosso pensar, sentir e agir no tempo e no espaço, de modo a aprofundarmos aquilo que significa sermos dom de nós próprios.
O caminho que a política está a levar em Portugal e em muitos países pelo mundo, está a afastar-se do sentido mais puro de serviço ao bem comum. A política deveria ser um caminho de serviço que eleva da vida humana a um nível de maior consciência da importância de inverter a paz como pausa entre guerras para a guerra como lapso efémero entre longas pausas de paz. Quem semeia compreensão mútua e estimula o diálogo, diminui a propensão para a discussão que leva a guerras sem sentido, mesmo as mais pequenas que ocorrem entre nós e que levam ao bater de portas.
Quando penso no gesto de serviço de lavar o pés feito por Jesus, penso como parece ser algo inglório. É verdade que os pés são o que mais sujamos quando caminhamos, fazendo sentido lavá-los. Mas depois de os lavar serão a primeira parte do corpo a sujar de novo. Logo, para quê? Uma vez na brincadeira, um amigo de infância dizia que porco é aquele que se lava por ser quem tem a necessidade de se lavar. Hoje, ao pensar neste trocadilho percebo que fazer do servir vital um gesto natural da nossa parte é reconhecer que o serviço aos outros contém um gérmen de purificação dos relacionamentos que temos com eles. Nem nós, nem o outro, estamos sujos nas intenções interiores, mas sujos, sim, estão, por vezes, os nossos relacionamentos quando descuramos o valor do entendimento mútuo.
Um relacionamento sujo assenta na desconfiança, na surdez recíproca, num voltar-se para si próprio, num desinteresse profundo pelo outro e pelo que lhe interessa, e quando os relacionamentos ficam sujos, semeia-se a destruição. O servir vital que nos coloca numa atitude de desapego, curiosidade, humildade e atenção plena, purifica o coração que serve para dar vida, lavando os relacionamentos com actos de amor incondicionais.
Se estivermos à espera de servir para sermos servidos, chamando a isso de reciprocidade, apelidando ao sentido do interesse mútuo para aprofundar relacionamentos, viveremos numa grande ilusão que estagna. Pois, a expectativa de receber depois de dar pode não acontecer. O servir vital oferece o que se é, sem esperar receber seja o que for do outro. Parece injusto, mas é mais realista quanto ao efeito que o servir vital tem na purificação dos relacionamentos.
O lava-pés de Jesus é o primeiro gesto que mostra como Ele veio salvar os nossos relacionamentos, começando por aquele servir vital. Seguiu-se ao serviço uma caminhada em direcção à morte, mas esse é o sentido natural da vida de todo o ser humano. Não vale a pena focarmos a nossa atenção no desfecho inevitável da morte, quando tanto e tão bem podemos fazer à humanidade de escolhêssemos, como Jesus, iniciar o progresso de renovação social com formas concretas de servir vital. Uma simples forma de começar poderia ser: criticar menos e escutar mais.
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