Começar de novo ou começar outra vez?

Crónicas 4 setembro 2024  •  Tempo de Leitura: 2

Há sempre em cada um de nós esta vontade (quase inata) de recomeçar. É como se pudéssemos colocar um ponto final fictício em tudo o que não era assim tão bom. Os inícios dão-nos a esperança de que alguma coisa seja diferente do que era. Como se houvesse uma promessa bonita que nos fala ao coração:

“Desta vez é que vai ser”

“Agora é que eu vou ter coragem”

“Desta vez vai ser melhor”

 

O problema dos recomeços, sejam eles em setembro ou quando estreamos o novo ano em janeiro, é que têm um elemento comum que nem sempre está disposto a mudar e a fazer diferente: nós.

 

Assim, é-nos mais fácil colocar a intenção naquilo que é exterior a nós, naquilo que não controlamos, naquilo que não prevemos e nas expectativas mais ou menos irrealistas do que na nossa própria responsabilidade e no protagonismo que somos chamados a ter perante a nossa vida.

 

Claro que é tentador colar os braços a esta novidade que se acende quando algo recomeça ou reinicia. O pior é que, se nos retiramos da equação principal, o resultado não vai corresponder ao que desejaríamos.

 

Por isso, e ao contrário do que costuma ser habitual lermos, o verdadeiro desafio não é recomeçar. É recomeçarmo-nos. É termos a capacidade de olhar para o que somos e perceber o que nos diz o novo e o velho. Para as páginas que compõem a nossa história e que nem sempre conseguimos ter a disponibilidade emocional para ver.

 

Mais ainda, somos chamados a perceber que a novidade está naquilo que conseguimos encontrar de diferente e de bom em cada dia, em vez de repetirmos o piloto automático do costume e ir mantendo o nosso coração em ponto morto, com o medo de arriscar. E arriscar não é sempre inaugurar caminhos novos. Às vezes, arriscar é ter simplesmente a coragem para olhar para trás.

 

Afinal, foi lá atrás que o caminho começou. Foi lá atrás que começamos. E ninguém estará capaz de (se) recomeçar se não tiver a coragem de ver o que nos trouxe até aqui.

Marta Arrais

Cronista

Nasceu em 1986. Possui mestrado em ensino de Inglês e Espanhol (FCSH-UNL). É professora. Faz diversas atividades de cariz voluntário com as Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus e com os Irmãos de S. João de Deus (em Portugal, Espanha e, mais recentemente, em Moçambique)

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