O tempo que perdemos
É imenso o tempo que perdemos a fazer o que nos mandam. A corresponder às expectativas nunca reconhecidas, nunca suficientes e permanentemente ajustadas à realidade de alguém que nunca somos nós.
Perdemos tempo a manter uma imagem de porcelana social; que nunca derreta, que nunca quebre, que nunca dê más respostas ou deixe antever qualquer réstia de má vontade. E é pouco aquilo que fazemos porque queremos. Porque gostamos ou porque nos apetece.
É tanto o tempo que se perde com ninharias. Com discussões intermináveis sobre este ou aquele tema da moda que não levam a lado algum. Nem nos dizem nada ao coração. Mas fica bem saber muitas coisas. E argumentar e fazer de conta. E assim vamos gastando fatias do nosso dia com o que não interessa e com quem interessa pouco.
É tanto o tempo que se perde a comprar coisas que ninguém vai usar. Em filas e em embrulhos com o papel igual. E a pobreza lá fora continua. E quem não tem casa continua a não ter. E quem não consegue pagar as contas continua a não conseguir. Mas vale tudo no reino do faz de conta. E até podemos nem ter amanhã se pudermos comprar hoje.
Passou o dia todo e amanhã repete-se tudo. Como naqueles filmes em que já todos sabemos o final, mas, ainda assim, é como se não soubéssemos. Sobra-nos pouco do que somos quando o dia acaba. Mas pelo menos aparecemos impecáveis, com um sorriso que se pendura para agradar e com menos três quilos de paciência.
Sobramo-nos pouco ao final do dia e, tantas vezes, já nem sabemos quem somos. São tantos os que nos pedem tudo e nunca somos nós a pedir.
Que saibamos dizer chega. E agora acabou. E quem manda em mim sou eu.
Porque não há nada tão urgente que não possa ficar para amanhã.
Quem muito se adia um dia deixa de fazer parte na equação mais importante:
Na sua.