Cristo Rei e o Amor: casado ou solteiro?
Estamos na última semana do ano. Domingo começa o Advento e com ele inicia o novo ano litúrgico. Desde que sou gente que me maravilha a festa de Cristo Rei que celebramos este fim de semana. Em miúdo seduzia-me a ideia de ter um rei. O Deus que acreditava desde a evangelização familiar, era REI. Brilhavam os meus olhos ao celebrá-Lo. Era algo nobre. Era bom acreditar em alguém que era da nobreza. Sempre me senti um sortudo. Com a idade e a catequese, este rei foi sendo desconstruído. Foi perdendo a beleza "medieval" que eu tanto via e idealizava. Este rei era, de facto, de outro mundo.
«Quando eu era criança, falava como criança, pensava como criança, raciocinava como criança. Desde que me tornei homem, eliminei as coisas de criança. Hoje vemos como por um espelho, confusamente; mas então veremos face a face. Hoje conheço em parte; mas então conhecerei totalmente, como eu sou conhecido. Por ora subsistem a fé, a esperança e a caridade – as três. Porém, a maior delas é a caridade.» (1ª Cor 13, 11-13)
Com o meu crescimento, Jesus foi afirmando-se não como esse rei autoritário e dominador, mas como frágil e servidor. Ao ponto de querer reinar no coração de todo o ser humano e dispensar as mordomias deste mundo. E São Paulo, na carta aos Coríntios, é bastante elucidativo sobre a Caridade, sobre o Amor deste rei.
Depois da celebração da Páscoa, a solenidade de Cristo Rei é a festa mais marcante para mim. Se na Páscoa Deus mostra-se como é, na festa do Cristo Rei Ele diz-nos o que espera de nós. Como ouvimos no evangelho segundo Mateus, o encontro final com Deus não vai ser uma "mega" análise de preceitos e mandamentos cumpridos. Tudo se resumirá à Caridade, ao Amor praticado para com Jesus, nos outros. No fim dos tempos e face a face seremos confrontados se ao longo da nossa vida vimos "como por um espelho" Jesus nos outros.
Pelo evangelho deste domingo, não seremos confrontados por quantas vezes fomos à missa, à confissão ou se cumprimos com todos os mandamentos. Mas sim se amamos o outro. Portanto, ser cristão é ser aquele que escuta o Evangelho, a Palavra de Deus que é Jesus. Jesus encarnou, fez-se homem e como tal amou até dar a vida por nós. Ser cristão é "encarnar" essa Palavra. É aproximá-La de nós e dos outros. É torná-La concreta e não abstrata. É ser Caridade, Amor.
Por esta razão é que quando me perguntam sobre o celibato dos padres, respondo que, quando a Igreja entender que a encarnação da Palavra for melhor testemunhada e vivida com padres casados, que se altere a lei canónica.
Quem estudou um pouco de teologia ou história da Igreja sabe que os cristãos católicos de Rito Oriental ou Bizantino têm sacerdotes casados. E que a Igreja de Rito Latino já os teve. O celibato tornou-se obrigatório para os padres não monásticos (estes, como frades, vivem em comunidade) porque havia como que uma "contaminação" pelas tentações que o homem comum sofria. Como os celibatários estavam mais "distantes" destas tentações, a Igreja optou pelos não-casados, para evitar tantas situações de escândalo. Porém, será que hoje o celibato é fundamental para manter a "dignidade sacerdotal"? As comunidades paroquiais respeitam mais um padre por ser celibatário ou chefe de família? Aquele que aconselha os casais da sua paróquia é tido mais em conta sendo casado ou célibe? Se o padre for autoritário, intolerante ou corrupto, é mais respeitado por ser celibatário ou casado?
São questões que não têm resposta "acertada". Haverão sempre, e graças a Deus, os que optam pela virgindade e pelo celibato. No entanto, os sacerdotes não consagrados, se um dia destes, não forem celibatários, não me escandalizará. O importante é o serviço ao outro. Servindo o outro estamos a servir Jesus. E será por isso que um dia seremos "julgados".
Bom início de Advento. Tenhamos a coragem de rejuvenescer.