Não incomodar!
Ainda estamos longe do que era suposto aprendermos com todas as contrariedades que temos vivido.
Continuamos a não querer saber dos desconhecidos que nos rodeiam, tal como já antes não queríamos.
Ainda estamos muito longe de nos tornarmos melhores cidadãos, melhores pessoas, melhores membros de um grupo (seja ele qual for).
Continuamos a não nos importar com o que este novo tempo trouxe e temos (ainda mais do que antes) um letreiro gigantesco pendurado na testa que diz: NÃO INCOMODAR.
Não era já tempo de nos deixarmos incomodar? De nos deixarmos afetar com as voltas que o mundo já deu nos últimos meses?
Não era já hora de deixar que o sofrimento alheio nos perturbe, nos deixe inquietos e nos faça sentir que não andamos cá sozinhos?
Era. Já era tempo e já era hora, mas não se vê nada que não se visse já naquele antigamente pré-pandemia. Vamos insistindo em desfilar os nossos umbigos pela rua, mas agora temos mais sorte e vamos mais bem disfarçados porque até usamos máscara. Que incómodo. Faz doer as orelhas. E embacia os óculos (a quem os usa). E faz calor. E nem sequer cheira bem. Que incómodo. Que chatice.
E é assim que vamos continuando. Sem olhar para além dos contornos do nosso corpo, do nosso círculo e, imagine-se, da nossa máscara. Dá-nos tanto jeito ter mais uma desculpa para não olhar para quem passa, não é?
Dá-nos tanto jeito ter mais uma desculpa para continuar, de olhos voluntariamente fechados à reviravolta de que estamos todos a ser testemunhas.
Não vejas. Deixa-te estar. Deixa-te ficar. Se a vida te mandou este aviso gigantesco e ainda não aprendeste nada, pensa bem no(s) impacto(s) que ainda podem estar para vir.